Resenhas

19 de março de 2017

Resenha #14: Aristóteles e Dante Descobrem Os Segredos do Universo - Benjamim Alire Sáenz

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"Às vezes, você faz coisas não porque pensou naquilo, mas porque sentiu. Sentiu demais. E nem sempre você pode se controlar quando sente demais."

Aristóteles e Dante Descobrem os Segredos do Universo


Livro: Aristóteles e Dante Descobrem Os Segredos do Universo
Autor: Benjamin Alire Sáenz
Páginas: 392
Editora: Seguinte
Sinopse: Dante sabe nadar. Ari não. Dante é articulado e confiante. Ari tem dificuldade com as palavras e duvida de si mesmo. Dante é apaixonado por poesia e arte. Ari se perde em pensamentos sobre seu irmão mais velho, que está na prisão.Um garoto como Dante, com um jeito tão único de ver o mundo, deveria ser a última pessoa capaz de romper as barreiras que Ari construiu em volta de si. Mas quando os dois se conhecem, logo surge uma forte ligação. Eles compartilham livros, pensamentos, sonhos, risadas - e começam a redefinir seus próprios mundos. Assim, descobrem que o amor e a amizade talvez sejam a chave para desvendar os segredos do Universo.




O que há com a chuva? Ela é simplesmente a precipitação da água atmosférica sob a forma de gotas? Ela é apenas resultado da impossibilidade das correntes ascendentes manterem em suspensão as partículas líquidas ou sólidas formadas pela precipitação do vapor de água contido na atmosfera? Ela é só símbolo de algo que mina em excesso, de promessas passageiras e tempestades de águas nocivas que logo vão embora?

E o que há com os sonhos? Eles são apenas a reunião das imagens, ideias, pensamentos ou fantasias que, geralmente confusas e sem nexo, se apresentam à mente no decorrer do sono? São os anseios e vontades permanentes? Os devaneios, de ideias disparatadas e sem nexo? São fantasia, pessoas em carne e osso, ou só o doce polvilhado com açúcar que encontramos na padaria?

O que são as coisas predeterminadas da vida que possuem um bilhão de significados no dicionário e quase nenhum parece certo, íntegro, respirador de nosso ar e defeitos e incertezas, zeitgeist e nostalgia e futuro distante? O que realmente são as palavras já rabiscadas e quem escolheu as que devem ser sublinhadas, reescritas ou apagadas?
Quem determinou descrições tão pobres e simples e rasas? Quem disse que tudo é tão assim ou assado? Quem disse?
QUEM DISSE? vocês vão querer se perguntar.



Quem disse que a chuva é só um conjunto de gotas que caem do céu? Quem disse que o sonho é algo confuso e sem nexo? Quem disse que Ari é um garoto solitário e perdido? Quem disse que Dante é um garoto mau porque gosta de beijar outros garotos?

Quem disse que quem diz algo é dono de todas as complexidades do alvo em questão? Quem disse que essa pessoa tem todas as conclusões bem na palma da mão? Porque, depois de Aristóteles e Dante descobrirem os segredos do universo deles, você não vai atrás das respostas do seu. Não. Você vai querer questioná-las.

Pois nada que é humano é exato ou corresponde a um cálculo simples. Nada que é humano se fabrica por uma fórmula infalível. Nem a porção correta de açúcar, tempero e o tudo o há de bom criou as meninas superpoderosas: o professor acrescentou acidentalmente o elemento x.

"E o que é o elemento x?" você pode se perguntar. Eu arrisco te responder: é o que você precisa que seja. Não o que quer, esse querer que é falho e calha na areia quando devia ir pra longe da costa. O elemento x é o que você precisa PRECISA. Nesse livro, Ari queria aprender a nadar. Queria ficar na dele, evasivo, cheio de humor sarcástico e irônico e sozinho. Ari queria conhecer mais sobre os pais, sobre o irmão. Mas o elemento x, o que ele precisava? Ele precisava de um amigo. Ou melhor: do amigo. Não era qualquer um. Era o Dante. Ele precisava do Dante.



No modo de preparo da receitinha errônea da vida, Ari somado ao elemento x fez nascer algo novo que não era novidade nenhuma e algo inesperado que não fora, de forma alguma, surpresa. Todavia, na etapa final da receita, pouco importa se o produto ficara bonito, feio, amassado, torto, escuro demais, escuro de menos. O vital é que os ingredientes tenham se unido, misturado, e numa massa homogênea tenham crescido. Crescido juntos. Separados antes em vasilhas diferentes e preparados cada um no seu potinho, a seu modo, a seu tempo, mas no fim, juntos.

E Ari e Dante faz o mesmo com você. Ele te divide e mistura e bate e amacia e cresce e fermenta e joga com o elemento x dentro de você. Ele é como a chuva, que molha a roupa e penetra a carne e congela os ossos - mas é também a chuva que cai e cheira e refresca e transporta do pesado pro flutuante, num efeito reverso, já que ela cai e você eleva.
Ari e Dante Descobrem os Segredos do Universo é como o sonho, aquele do REM e do sono profundo, que às vezes entristece, enlouquece, que faz tremer - contudo é também aquele travesso, gostoso, cheio de realizações dorminhocas que acordadas não somos capazes ou corajosos o bastante pra fazer.
Ari e Dante DOSDU é um sonho chuvoso ou uma chuva dos sonhos ou uma chuva de sonhos caindo dos céus. É saturado com ingredientes humanos numa receita pulverizadora e cheinho do seu e apenas seu elemento x, leitor que sente e sofre e ama. É uma leitura que dói. Que sangra. Que cura. Que anestesia. Você não lerá palavras que quer ler: lerá palavras que PRECISA.
E é aí que está a magia. O autor não faz um mundo cor de rosa que sonho é só bom e chuva é só fraquinha: ele mostra que o mundo é uma caca sim e uma caca-das-grandes-com-certeza. Só que, com o elemento x, você voa e saem arco-íris dos seus pés; e pra viver você tem que questionar. Sem estagnação. Sem evitar cozinhar com medo de errar a receita. Sem aceitar uma vida que fizeram pra você. Você não deve deixar de dormir pois seus sonhos te aterrorizam e muito menos ficar fora da chuva para não pegar um resfriado.

Que a vida (e o Ari) é inescrutável nós sabemos. Mas é por isso que temos o bolinho de chuva e o sonho de valsa. A gente questiona e mistura. Acha um jeito. Acha o elemento x. Chega não no ponto da receita ou da vida ou do chef da tv - a gente chega no pontinho que queremos (ou precisamos). E é doce. Doce como comer bolinho de chuva num dia tempestuoso e dar uma mordida no sonho de valsa pós pesadelo.
Porque, depois de AEDDOSDU, quem disse que tem de ser assim ou assado? Quem?



Postado por Unknown

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